quinta-feira, abril 05, 2007

Poeira

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Esta foto dá uma ideia do filme

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E esta dá uma ideia da cor

Fiquei com sentimentos contraditórios sobre As Cartas de Iwo Jima quando revi. O filme tem o que me parece ser um verdadeiro achado: o cinzento acastanhado, ou castanho de poeira muito suja, que dá o tom a todo o filme. O fogo da aviação americana contrasta fortemente nessa espécie de cor de sépia; e as dezenas de navios de que está pejado o mar cinzento, no ataque à ilha, fazem pensar na invasão de uma espécie animal. Graças a isso, parece-me que Clint Eastwood mostra a guerra como ainda ninguém a tinha filmado antes. Eastwood joga com os efeitos de cor: às vezes há uma nesga de céu bem azul por sobre a ilha cinzenta, no final o horizonte é avermelhado. Mas também lhe foge a mão, como quando o sangue espirra vermelho vivo do soldado que se faz rebentar com uma granada, por sobre a foto cinzenta da família que ele guardava na outra mão. A mensagem emocional que se pretende transmitir com isto peca por – digamos – excessivamente evidente.

Aquilo a que eu não consigo aderir é precisamente a esta sentimentalização excessiva. Os flashbacks são todos pavorosos todos, acho que sem excepção. As cenas de pendor sentimental são sempre introduzidas por uma musiquinha irritante, composta por Kyle Eastwood (filho do realizador) e Michael Stevens. Os heróis japoneses (o general e o cavaleiro) são ambos pró-americanos: aparecem em cenas ridículas a falar inglês; as suas recordações da América surgem nuns flashbacks delicodoces que achei dolorosos; e prestam homenagem à América, onde ambos viveram. Às vezes pergunto-me se o defeito é meu, mas o que é facto é que as cenas que revelam a crueldade humana (por exemplo, a corajosa cena em que Eastwood mostra dois soldados americanos a matarem a sangue-frio prisioneiros de guerra) são quase sempre muito mais persuasivas do que as cenas «do bem», aquelas onde se mostra a bondade comum do ser humano. É certo que o texto de algumas cartas (as cartas japonesas e a carta do soldado americano que morre) é tocante, mas também é certo que Eastwood não resiste à tentação de sublinhar, de enfatizar, de tornar tudo demasiado patético e redundante.

O filme é longo demais, mas a segunda metade é melhor do que a primeira.

Todas as cenas de 1945 são melhores do que as que remetem para antes ou depois da batalha. (Aliás, Clint Eastwood tem a seu crédito os cinco minutos mais lamentáveis inseridos num filme de resto excelente, que é o flashforward final de As Pontes de Madison County.)

Dito isto, será com certeza um dos melhores filmes que vejo em estreia este ano. (Para ter uma ideia da música e da cor, o site é útil.)

Oh, well. Depois de escrever isto, descubro que o mesmo (e mais) já estava dito neste texto do Independent. Letters From Iwo Jima doesn’t have much to say except that Japanese are human beings, too.