terça-feira, junho 12, 2007

Rorty, da ironia


Não foi pelos jornais, mas pelo Rui Tavares que me dei conta da morte de Richard Rorty, filósofo americano, pragmatista, aqui há dias. O Guardian traz hoje um excelente obituário.


Rorty certainly delighted in being provocative, even claiming that, despite George Orwell's famous "freedom is the freedom to say 2 + 2 = 4", the only real problem with Winston (in Nineteen Eighty-Four) coming to believe that 2 + 2 = 5 is that the belief is induced by torture, truth being irrelevant.


Também gostei muito de uma carta de um leitor que aparece no blog de Andrew Sullivan, estabelecendo afinidades entre Rorty (um social-democrata) e o conservadorismo de Oakeshott.


For most on the right, Rorty is merely a symbol of the country's slow slide into post-modernism and relativism. You avoid that stupid sticky brush, but still do not give him enough credit. Your political conclusions may have differed, but your underlying commitments are very much the same. Rorty was a progressive and a liberal, but he was your kind of liberal.


O texto do Los Angeles Times tem um tom amargo, mas inclui esta definição:

Rorty had an astonishing combination of cynicism and idealism, a quality he called «irony».

Pelo aspecto pessoal, vale a pena ler a nota de Habermas.

I received the news in an email almost exactly a year ago. As so often in recent years, Rorty voiced his resignation at the "war president" Bush, whose policies deeply aggrieved him, the patriot who had always sought to "achieve" his country. After three or four paragraphs of sarcastic analysis came the unexpected sentence: "Alas, I have come down with the same disease that killed Derrida." As if to attenuate the reader's shock, he added in jest that his daughter felt this kind of cancer must come from "reading too much Heidegger."

Que eu saiba, há dois livros de Rorty editados em Portugal. Um é A Filosofia e o espelho da natureza, o livro que, em 1979, o fez famoso. Diz Rorty que essa obra teve sucesso porque foi vista como uma espécie de sequela a A Estrutura das Revoluções Centíficas, de Thomas Kuhn (sem edição portuguesa) – e foi precisamente por essa ordem que me veio parar às mãos. Não sei se a tradução portuguesa é aceitável (não li), mas estava na semana passada à venda, com uma capa bonitinha, no pavilhão de saldos da Dom Quixote na feira do livro de Lisboa, por 5 euros. O outro livro é Contingência, Ironia e Solidariedade (1989), que faz a ligação entre as convicções de Rorty sobre a natureza do conhecimento e as suas convicções políticas, através do conceito de ironia. É também, ao mesmo tempo, uma defesa da ficção, da literatura, do cinema, e de uma concepção das Humanidades que não faz distinções entre disciplinas nem tem ambições «científicas». Infelizmente, a tradução portuguesa, da Presença, é mazinha, dá o seu trabalho a decifrar. É o género de tradução que se lê fazendo mentalmente o trabalho de tradução ao contrário: tentando descobrir o que é que o autor teria escrito no original, e que com a pata do tradutor resultou assim.