quarta-feira, março 26, 2008

A selva

Não conheço em pormenor as disposições do acordo ortográfico, de modo que o meu texto, mais do que seguir uma norma, faz uma apropriação um tanto selvagem daquilo que me interessa. A minha brasilofilia é conhecida, e há tempo que eu deixei de usar «p» em ótimo, e retiro com gosto o «c» em fato. A minha mistura de português de Portugal com português do Brasil não é mais que uma pequena utopia pessoal. Mas simpatizo com o acordo: não, como diz o ministro, porque possamos passar a ter «uma língua unificada» (vocês dêem um desconto), mas na medida em que ele adapte algumas coisas que está na hora de serem adaptadas.
Ah: e eu não duvido por um segundo da superioridade do português do Brasil.

terça-feira, março 25, 2008

Honestos falsificadores


Por razões que superam o meu entendimento, a crítica portuguesa (dos jornais que leio, de que de fato são poucos) reagiu com frieza a Os Falsificadores, a fita austríaca que este ano ganhou o Óscar de melhor filme estrangeiro. Trata-se de um filme muito acima da média, a história de um grupo de judeus no campo de concentração que são identificados pelos seus carcereiros como especialmente hábeis na contrafação: são capazes de imitar perfeitamente as notas de libra inglesa, e podem constituir um auxílio muito útil ao esforço de guerra. Em contrapartida, gozam de um tratamento de relativo privilégio, comparado com os outros presos, e têm a sobrevivência mais ou menos garantida. O alcance deste compromisso não é pequeno: se os nazis fossem capazes de falsificar o dólar, isso constituiria para eles, em 1945, uma fonte vital de oxigénio. O filme, que é servido por um ótimo ator (Karl Markovics) no papel do protagonista, coloca-nos pois no centro de um dilema moral: como espectadores, identificamo-nos naturalmente com ele, e por isso desejamos que sobreviva; mas um outro personagem lembra-nos constantemente a implicação disto, em termos de colaboração numa empreitada radicalmente imoral, que inclui o extermínio dos outros judeus. Estamos portanto perante um filme sobre o nazismo e os campos que, longe de nos colocar na posição relativamente confortável de contemplar o mal a partir de fora (com desprezo, com pena, com comiseração), nos coloca numa posição de desconforto moral, de julgamento difícil, de conflito entre instintos emocionais (a empatia com o protagonista) e escolhas racionais (do domínio da abstração).
Que seja ainda possível fazer um filme sobre o nazismo que nos surpreenda, que conte uma história que quase não conhecíamos e nos obrigue a enfrentar o assunto sob um prisma que quase nunca fomos chamados a contemplar, já é bastante bom. Que isso seja servido por uma realização esteticamente «limpa», sem grandes artifícios ou truques sentimentais, e ainda bons atores, é razão mais que suficiente para chamar a atenção. Em Lisboa, Os Falsificadores já só está no Corte Inglês.

terça-feira, março 18, 2008

Lúcida

Um fim-de-semana em cheio para o Irmão Lúcia: um boneco, um teste e uma teoria política.

sexta-feira, março 14, 2008

The dismal science


O paper de Paul Krugman, de 1978, sobre a teoria do comércio intergalático é o género de texto que faz cócegas dentro da cabeça. «It should be noted that, while the subject of this paper is silly, the analysis actually does make sense. This paper, then, is a serious analysis of a ridiculous subject, which is of course the opposite of what is usual in economics.» É muito difícil lê-lo sem ter reação. [Obrigado à Mariana.]

terça-feira, março 11, 2008

Aleluia! Aleluia!


Ele vai estar em Portugal a 19 de Julho.

quarta-feira, março 05, 2008

A política do ui, que medo!

(um post a meias com o Filipe Nunes)


Era uma vez a Hillary Clinton, o Barack Obama e um português. A Hillary acusava o Obama de não saber responder em momentos de crise, de não ter experiência para reagir se o telefone tocasse às três da manhã, enquanto as crianças americanas dormem. O Obama contestava que a Hillary também não tinha muita experiência, e a experiência do marido dela não era a experiência dela. Foram, então, perguntar ao português. Ele respondeu assim:

"Eu lembro-me de uma vez um governador do Banco de Portugal me ter telefonado às duas horas da manhã, para casa, estava eu a dormir perfeitamente, tranquilamente, a dizer: "Mário, é uma desgraça, é uma desgraça, amanhã isto vai quebrar, porque nós passámos à linha vermelha e agora já não temos dinheiro para pagar. Se há uma corrida aos bancos é a bancarrota." E eu respondi-lhe: "Olhe, ó meu caro amigo, o senhor governador faça favor, para a próxima vez, não me acorde às duas da manhã, porque se é a bancarrota eu tenho de estar lúcido amanhã de manhã e, portanto, preciso de dormir agora. Deixe-me lá dormir." Bem, não houve bancarrota. Mas estivemos muito próximo, realmente."